Depois
de delinear sobre a endometriose, no segundo texto do médico, hoje
aposentado clinicamente, mas que ainda ativo como cientista e é um dos principais estudiosos da doença, o americano doutor David Redwine vai começar a delinear alguns
fundamentos da teoria a qual acredita e que vem estudando há mais de 3 décadas. Na primeira parte do "Redefinindo a endometriose na era moderna", ele explica porque a
endo é uma doença tão comum. É incrível como ando conhecendo mulheres com endo.
Sabe naquele dia que não quero nem tocar no assunto, porque estou entre amigos
me divertindo? Então, é nesse dia que mais aparece portadoras ou possíveis portadoras. Segundo pesquisas do doutor
Redwine, a doença tem origem embrionária que somando-se à fatores de
pré-disposição genética, mais fatores ambientais resultam na doença, já que a
doença já foi encontrada em meninas de 10 anos, e até em senhoras de 78 anos,
inclusive, num feto de semanas. No texto, ele também fala do difícil
diagnóstico pelo fato de a doença ter sintomas que são confundidos com outras
doenças. Aliás, isso é muito comum no Brasil. A mulher vai ao consultório,
relata os sintomas, e em vez do médico ter todas as hipóteses a serem
descartadas, ele diz que ela tem a doença tal, como a SII, síndrome do
intestino irritável, dentre muitas outras. Esta é uma das razões que o
diagnóstico ainda é muito tardio. No meu caso demorei 18 anos para descobrir que era portadora. Como o texto é muito, muito longo, ele será publicado e três partes. No próximo, o doutor Redwine fala da origem da doença, alguns tipos de endometriose e seus sintomas e também da importância do exame físico.
E não se esqueça de preencher a ficha
de inscrição para a Million Women March for Endometriosis, a
maior manifestação em massa do mundo em prol de uma doença, nunca realizada antes.
Até o momento 23 países sairão às ruas no dia 13 de março de 2014 para mostrar
a todas as pessoas do mundo que existimos, que somos muitas (176 milhões de
mulheres), reivindicar nossos direitos, cuidados, tratamento especializado
acessível em todo país, inclusive, no SUS, conscientizar a sociedade, pois só
assim passaremos a ser tratadas com o respeito e a dignidade que merecemos.
Esta é a nossa grande chance de ter a doença reconhecida como social pelo
governo federal, já que temos um dos maiores especialistas do mundo, o doutor
Camran Nezhat, à frente da Marcha de Milhões de Mulheres contra a
Endometriose. Compartilhe a Fichade
Inscrição entre seus amigos. Todos podem e devem participar.
Afinal, a endo
não tem idade e basta ser mulher para ter a possibilidade de
desenvolver a doença. A união faz a força e juntas somos mais fortes!! Beijo
carinhoso!! Caroline Salazar
Redefinindo a
endometriose na era moderna - parte 1
Por doutor David Redwine
Tradução: Alexandre Vaz
Edição: Caroline Salazar
Introdução:
Endometriose é um tecido que se
assemelha ao revestimento do endométrio (camada que reveste o útero), mas que
pode ser encontrado fora do mesmo em locais do corpo onde não deveria existir.
O principal sintoma da doença é a dor. A endometriose sintomática afeta
aproximadamente de 5% a 10% das mulheres, embora até 40% possa ser portadora da
doença numa forma assintomática (nota da editora: as mulheres que não
têm dor).
Isto faz da endometriose uma das
doenças humanas mais comuns no mundo inteiro. Embora, a endometriose seja um
assunto referido na literatura médica desde o século 19, verifica-se muita
confusão durante décadas acerca de sua origem e sobre qual será o tratamento
adequado. Finalmente, após um século, as opiniões começam a ser substituídas
por fatos, que permitem melhores diagnósticos e uma abordagem mais racional ao
tratamento da doença.
Breve história do estudo da
endometriose:
No histórico da evolução do
conhecimento sobre qualquer doença, a manifestação clinicamente mais óbvia e
gravosa é a primeira a ser identificada. Esta forma grave pode ser uma
representação incorreta da verdadeira natureza da doença. Uma doença que
requeira cirurgia para se obter confirmação de diagnóstico, e cujo resultado
seja frequentemente incorreto, sofrerá dois níveis de influência no
diagnóstico, escondendo ainda mais a verdadeira natureza da doença.
Uma doença cujos sintomas possam ser
“imitados” por outras doenças, será mal interpretada com base nas suas próprias
características. Todos estes fatores conjuntos irão conduzir ainda mais à
incompreensão da doença. Como resultado, surgem mitos para explicar a
perplexidade, tentativas fúteis de tratamentos são inevitáveis, e os
profissionais de medicina confusos irão seguir falsos profetas que os levarão
para um deserto intelectual. É exatamente isso que tem acontecido nos últimos
85 anos no que toca à endometriose.
Entre as manifestações iniciais
descritas nos relatórios de casos individuais na referida literatura estão
incluídos vários nódulos graves retovaginais, e cistos nos ovários designados
como “chocolate”. Nódulos de endometriose envolvendo estruturas
parenquimatosas, tais como os ligamentos úterossacros ou a parede intestinal,
foram historicamente comparados a adenomiomas que eram conhecidos por afetar o
miométrio uterino (nota da editora: camada externa do endométrio,
que nada mais é do que a parede externa que reveste o útero). Como tal, as
manifestações iniciais de endometriose grave eram designadas por adenomiomas,
sendo identificadas na vagina, reto, ligamento redondo do útero, onde atravessa
o canal inguinal.
"Apesar
de a endometriose ser um assunto da literatura médica desde o século 19,
a confusão sobre a doença, sua origem e tratamento adequados se
desencadeou durante décadas. Finalmente, no início do século 21,
a opinião está sendo substituída pela verdade, o que está permitindo um
melhor diagnóstico e tratamento mais racional da doença ." (David Redwine)
Num influente estudo inicial, os cistos
chamados de “chocolate” nos ovários foram observados em 23 mulheres, dando
assim a ideia de que os ovários são a localização mais comum na pelve para a
endometriose, embora muitos dos cistos descritos nesse estudo fossem “corpora
lútea” (corpos de argila). Porque o grupo de estudo não tinha mulheres
adolescentes ou em menopausa entre as que exibiram cistos “chocolate” nos
ovários. Daí surgiu a ideia de que a endometriose é uma doença presente apenas
na idade reprodutiva, e que a menopausa em si cria uma proteção contra a
doença. Nessa era de ingenuidade intelectual, era assumido que a fertilidade
natural se aproximava dos 100%.
Como cerca de 60% das mulheres casadas
com endometriose nesse estudo já tinham estado grávidas foi assumido que a
gravidez seria uma proteção contra a doença, e que a endometriose diminuía
gravemente a fertilidade. Devido ao fato de que alguma endometriose é
semelhante ao endométrio, a ideia simplista de refluxo da menstruação surgiu
como o mecanismo de origem da doença e reina como a teoria mais aceita até
recentemente.
A teoria de refluxo menstrual de
Sampson alega que a endometriose surge a partir de partículas do endométrio que
descamam durante o trajeto do fluxo menstrual a partir da cavidade uterina de
uma forma retrógrada pela das trompas de falópio. Estas células aderem então a
superfícies peritoneais, proliferam e invadem os órgãos. A endometriose tem
sido encarada como incurável, já que a pelve será realimentada com a doença
todos os meses durante a menstruação. Como a endometriose foi declarada como
sendo um autotransplante idêntico ao endométrio, pensavava-se que sangraria
todos os meses durante a menstruação.
Isto daria às lesões um aspecto visual
hemorrágico e conduziria à noção de “lesão de queimadura de pólvora” como sendo
a manifestação visual mais comum da doença. Só após meados dos anos 1980 é que
investigadores clínicos deram a sua contribuição. Auxiliados em grande parte
pela ampliação da laparoscopia (a cirurgia minimamente invasiva), ao
documentarem a ocorrência da doença no seu estado mais subtil, o
não-hemorrágico, completou-se assim o espectro morfológico da doença. A
manifestação visual da endometriose que tinha sido adotada há muito tempo como
a mais comum, era afinal, a menos comum, colocando imediatamente em dúvida tudo o
que se pensava saber e que tinha sido publicado até então.
Sobre a teoria de
Sampson ..."ele
não tinha todos os fatos que temos hoje, por isso a sua teoria foi
baseada principalmente na especulação. Nessas circunstâncias existentes na
época, haveria uma probabilidade muito baixa de que sua teoria deve ser correta
..." (David Redwine)
O colapso de um paradigma tinha
começado. Quando se percebeu que os autores dos primeiros artigos não sabiam
qual era o aspecto da endometriose, e que a endometriose tem cura por cirurgia
convencional, a laparoscopia (nota da editora: quando o cirurgião sabe
observar e retirar todos, mas todos os focos) e que os focos de endometriose
são diferentes do endométrio em dezenas de aspectos, que as provas de uma
aderência inicial seguida por uma invasão secundária foram procuradas, mas
nunca encontradas.
Quando os apoiantes da teoria do
refluxo menstrual recusaram firmemente a fornecer imagens documentais da
aderência inicial, da proliferação secundária e invasão pelas células do
refluxo endometrial (que alegadamente ocorrem aos milhões), finalmente a teoria
de Sampson foi abandonada pela maioria dos peritos.
O fato de esta teoria ter sobrevivido
durante tanto tempo com tantas contradições fatais e sem provas que a
sustentassem é notável e dá uma má imagem da profissão de ginecologista, que a
usaram durante décadas como uma explicação conveniente para todos os
tratamentos falhados, em vez de responsabilizar os tratamentos médicos e
cirúrgicos que ainda são usados até à data por alguns.
Parabéns pela matéria!Super interessante e esclarecedora. Ansiosa para a parte 2! :)Beijoss
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