quinta-feira, 9 de julho de 2015

DAVID REDWINE: ENDOMETRIOSE INTESTINAL - TRATAMENTO CIRÚRGICO - PARTE 3!

Após falarmos do histórico, dos sintomas e do diagnóstico da endometriose intestinal, na terceira parte do texto, o doutor Redwine aborda o tratamento cirúrgico da doença, desde as lesões superficiais às profundas. Aqui ele fala porque a cirurgia é o tratamento definitvo para a doença. Boa leitura. Beijo carinhoso! Caroline Salazar

Por doutor David Redwine 
Tradução: doutor Alysson Zanatta
Edição: Caroline Salazar


Tratamento Cirúrgico:
A endometriose intestinal pode ser tratada por ressecções que são superficiais, tipo “shaving” profundo, discoides ou segmentares. A maior parte das mulheres com endometriose intestinal não necessitará de ressecção segmentar. Preparo intestinal e antibióticos pré-operatórios serão utilizados caso seja antecipada a necessidade de procedimento intestinal. Com o aumento do número de áreas intestinais acometidas pela doença, cresce a probabilidade de uma ressecção de espessura total ou segmentar (Fig. 13). A remoção dos órgãos pélvicos não é necessária para o tratamento de sucesso da endometriose intestinal.



Figura 13. Com o aumento do número de áreas intestinais acometidas por endometriose, aumenta a probabilidade de ressecção discoide ou segmentar.
A parede do cólon intraperitoneal é composta de quatro camadas: serosa, muscular externa longitudinal, muscular interna circular, e mucosa. Abaixo da reflexão do fundo de saco, a camada serosa está ausente. A parede do intestino delgado é semelhante, porém mais fina. Portanto, a camada muscular do intestino delgado comporta-se cirurgicamente como uma camada única. Essas camadas da parede intestinal podem ser utilizadas a favor do cirurgião durante o tratamento da endometriose intestinal porque geralmente uma camada envolvida pela endometriose pode ser “descascada” (nota do tradutor: separada) das outras camadas subjacentes, resultando em uma ressecção de espessura parcial que pode desnudar a camada mucosa em alguns casos. As técnicas descritas a seguir podem ser realizadas mais efetivamente com três punções e uma tesoura monopolar de 3-mm através do canal operatório do laparoscópio de 10 mm, utilizando-se dissecção por corte ou excisão elétrica com 90 watts de potência em corrente de corte puro [37].  A cirurgia de endometriose intestinal é ditada pelo grau de profundidade de invasão e localização da doença. Desse modo, várias técnicas são necessárias, todas guiadas em parte pela palpação da parede intestinal na busca por nódulos.
Lesões Superficiais:
A tesoura corta perpendicularmente na parede intestinal sadia adjacente à lesão, primeiro penetrando na camada muscular externa do intestino. Prende-se a lesão e faz-se a sua dissecção, com a tesoura trabalhando em uma das camadas musculares. A dissecção pode rapidamente evoluir além da lesão, portanto deve-se tomar cuidado para decidir quando deve-se parar de cortar. A sutura da parede intestinal com algodão 2-0 é prática e inteligente. Pode-se adquirir uma valiosa experiência suturando-se pequenos defeitos da parede intestinal. Para que a sutura interna seja fácil, deve-se manter dois pontos em mente: (1) o bordo longo do fio de sutura deve ser seguro de modo a formar um arco apontando para o trocater pelo qual se passa o instrumento para se fazer o nó. (2) O bordo curto do fio de sutura deve ser posicionado imediatamente abaixo do ponto onde o nó será atado (Fig. 14). Isso evita que se fique buscando pelo bordo do fio, o que pode fazer com que a sutura saia do tecido.


Figura 14. O nó intracorpóreo é fácil desde que alguns passos sejam seguidos. A pinça da esquerda segura o fio de sutura de modo que forme um arco cujo eixo de simetria é direcionado ao instrumento que realizará o nó, nesse caso o porta-agulhas passado através do trocater à direita. O bordo curto da sutura é posicionado imediatamente abaixo onde o nó será atado para que seja facilmente alcançado.
Shaving” profundo:
Eventualmente, uma grande lesão necessitará de dissecção até a mucosa para uma ressecção completa. Se não houver fibrose submucosa, ambas as camadas musculares podem ser facilmente descascadas da mucosa com uma dissecção cortante e romba (Fig. 15.), uma técnica ocasionalmente referida como “shaving profundo”. Uma vez que a lesão tenha sido isolada, utiliza-se a tesoura para ressecá-la da superfície do intestino. Fique atento para não ultrapassar o nódulo antes de ressecá-lo. Suturas de algodão 2-0 são utilizadas para o fechamento da serosa e da muscular em uma única camada. A profilaxia antibiótica é opcional.
Figura 15. “Shaving profundo” do cólon para tratamento de endometriose intestinal. A pinça à esquerda está segurando o nódulo de endometriose que está sendo dissecado da mucosa subjacente. A tesoura de 3 mm está repousando diretamente sobre a mucosa intacta. Note as estrias lineares da camada muscular circular interna.
Ressecção de íleo:
O íleo é mais comumente afetado em sua porção terminal. Uma massa na parede do intestino pode não ser visualizada por alterações superficiais, porém pode ser diagnosticada à palpação com as pinças. A cirurgia laparoscópica no íleo é possível, porém é difícil devido ao posicionamento típico dos trocateres para cirurgias na pelve.  A tesoura pode ser usada para excisão do nódulo na camada muscular pela técnica de “shaving” profundo. Com cuidado, muitos nódulos podem ser removidos sem adentrarmos a luz intestinal. Boa parte das suturas devem ser realizadas com algodão 3-0 em pontos simples já que a parede do íleo é fina.
Como o íleo pode estar acometido por várias lesões que podem ser superficiais ou profundas, a cirurgia laparoscópica pode ser entediante, mesmo que sejam colocados trocateres adicionais. Em muitos casos, é mais eficiente realizar-se a mobilização laparoscópica dos ligamentos peritoneais do íleo e ceco de forma que o íleo possa ser exteriorizado por uma incisão de mini-laparotomia onde as ressecções intestinais possam ser realizadas por “shaving” profundo, discoide, ou segmentares (Figuras. 16-18). Esta incisão de mini-laparotomia pode ser uma ampliação da incisão no quadrante inferior direito ou da incisão umbilical. Eventualmente, o íleo pode ser exteriorizado através da vagina se houver mobilidade suficiente (Fig. 19).
Figura 16. A incisão de 5 mm no quadrante inferior direito foi discretamente ampliada e o íleo é visto através da incisão. Sem tração, essa incisão mede 3 cm.
Figura 17. O íleo foi exteriorizado sobre a parede abdominal para a realização da ressecção da lesão linear sobre a borda anti-mesentérica.
Figura 18. A endometriose do íleo foi removida por ressecção de espessura total. As luzes intestinais proximal e distal são visualizadas. Cada ângulo da mucosa intacta no lado mesentérico da parede intestinal é tracionado por uma pinça. O intestino é fechado em duas camadas de um ângulo ao outro.
Ressecção discoide de espessura total do cólon:
Se houver fibrose submucosa, ou se o nódulo for grande, adentrar aa luz intestinal é inevitável. Entrar na luz intestinal permite também a palpação da lesão através da mucosa, e assim pode-se determinar com maior exatidão o ponto de parada da dissecção. A mucosa pode ser fechada com sutura contínua de Vicryl 3-0 e a camada seromuscular com algodão 2-0 em pontos simples. A pelve pode ser irrigada com fluidos e injeta-se ar no cólon através de um retossigmoidoscópio para se observar vazamento de bolhas. Caso haja, este deve ser reparado com suturas.
Apendicectomia:
A apendicectomia com energia monopolar é rápida e simples. Segura-se a ponta do apêndice e utiliza-se tesoura monopolar de 3 mm com 50 watts de potencia em corrente de coagulação para dissecção ao longo de sua parede, onde os vasos sanguíneos são relativamente pequenos (Fig. 20). Assim, os vasos sanguíneos são cortados e coagulados simultaneamente até que se alcance o ceco (Fig. 21). Três suturas em alça são aplicadas ao redor da base do apêndice denudado e corta-se entre as suturas (Fig. 22). Segura-se o apêndice com a tesoura e este é retirado pela punção umbilical de 10 mm. O coto do apêndice pode ser levemente coagulado e sepultado abaixo da superfície do ceco com uma sutura em bolsa, se desejado.


Figura 20. A apendicectomia com corrente monopolar começa com a dissecção do apêndice ao longo de sua parede. Isso é realizado imediatamente adjacente à sua parede, onde os vasos sanguíneos são menores.
Sobre o doutor Alysson Zanatta:



Graduado e com residência médica pela Universidade Estadual de Londrina, doutor Alysson Zanatta tem especializações em uroginecologia e cirurgia vaginal pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), cirurgia laparoscópica pelo Hospital Pérola Byington de São Paulo e doutorado pela Universidade de São Paulo, USP. Suas principais áreas de atuação são a pesquisa e o tratamento da endometriose, com ênfase na cirurgia de remoção máxima da doença. Seus inter­esses são voltados para iniciativas que promovem a conscientização da população sobre a doença, como forma de tratar a doença adequadamente. É diretor da Clínica Pelvi Uroginecologia e Cirurgia Ginecológica em Brasília, no Distrito Federal, onde atende mulheres com endometriose, e Professor-adjunto de Ginecologia da Universidade de Brasília (UnB). (Acesse o currículo lattes do doutor Alysson Zanatta). 

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