imagem cedida por Free Digital Photos |
Por Caroline Salazar
Edição: doutor Alysson Zanatta
Na última enquete realizada na fanpage do A Endometriose e Eu pedindo sugestões de temas a
serem abordados por mim aqui no blog, recebi uma que achei muito interessante e coerente proposto pela Alessandra Iório sobre o machismo x endometriose. Segue
parte do relato de Alessandra:
"Acho que um tema pouco
abordado para as portadoras diagnosticadas ou não é o machismo dos profissionais
da área. Muito se fala sobre como não se considera a intensidade da dor da
paciente nas consultas e atendimentos de emergência, e essa é a parte mais
importante da questão, mas há outras formas mais sutis e complexas de
identificar o problema. Muitas vezes fui questionada a respeito da minha
aparência, juventude ou vida pessoal. Em um momento de dor fica difícil
discernir o que é informação relevante para o profissional construir um
histórico detalhado e o que é falta de ética e até mesmo assédio. Mesmo quando
o conseguimos, é comum não ter força física ou psicológica suficiente para
combater o preconceito. Dois exemplos: já me disseram que tenho endometriose
porque não tinha um parceiro que me proporcionasse prazer sexual como
tratamento e me calei de dor. Já me questionaram o porquê não sou casada ou
tenho filhos e não consegui energia mental para dizer que não sou obrigada a
atender padrões sociais nem sou culpada de estar doente por causa disto. Hoje,
com 37 anos, consciente da minha condição e com a dor relativamente controlada
sei me posicionar quando percebo a diferença entre uma abordagem e outra. Mas
sou portadora de endometriose desde os 15 anos e nem sempre foi assim. O
machismo tem camadas, está presente em todas as esferas sociais e a área médica
não é exceção".
Infelizmente,
em pleno século XXI ainda vivemos num país machista. Há o machismo, mas também
a discriminação. A maioria dos especialistas é homens, muitos deles excelentes,
pois sei que a maioria das mulheres prefere ser atendidas por homens que por
mulheres. O fato de muitos especialistas (até mesmo as mulheres) chamarem a
endometriose de “a doença da mulher moderna” - (leia meu texto e do endomarido Alexandre sobre o tema) - é a ponta do iceberg do machismo
na endometriose. Ora nada tem a ver o fato de as mulheres postergarem a
gravidez com a endometriose. Só porque elas menstruam mais? Já cansamos de
dizer na coluna do doutor David Redwine que a endometriose não vem da
menstruação retrógrada (Teoria de Sampson). Já é sabido que a gravidez não cura a doença.
Portanto, se para ficar livre da doença não adianta ter filhos, então porque
ainda ouvimos médicos recomendando a gravidez como tratamento da endometriose?
Na coluna
“História das Leitoras” tem relatos de mulheres que conseguiram engravidar e
que passaram muito mal durante e após a gestação. Hoje a mulher tem o papel de
decidir o que ela quer para sua vida. Muitas não querem e não precisam
constituir uma família para serem felizes. Há técnicas de reprodução assistida
e a adoção para exercer a maternidade. Vivemos numa sociedade livre onde cada
ser humano é responsável por suas ações. O que não deve existir em nenhuma
área, em especial, na medicina são pessoas machistas que acham que a própria
mulher é a culpada por ter uma doença tão grave quanto à endometriose. É uma
atrocidade culpar a mulher por ter uma doença tão cruel como a endometriose. Como
disse nossa querida leitora Alessandra em seu comentário no início do texto “não
somos obrigada a atender padrões sociais”.
Há algum
tempo o papel da mulher na sociedade mudou e a tendência é que esta mudança
continue. De acordo com o Censo de 2010, 53% da população brasileira é formado
por mulheres e 37% das residências brasileiras são sustentadas por mulheres.
Mesmo as mulheres sendo a maioria o Brasil ainda figura como um país machista
por conta da mente antiga das pessoas. Precisamos mudar este quadro, abrir
nossas mentes para o novo. Parte da nossa mudança está em se informar melhor e
não aceitar ser atendidas por profissionais deste tipo.
Outra
questão relacionada ao machismo relatada por Alessandra diz respeito a um dos
principais sintomas da doença: a dispareunia. Segundo pesquisas, a dor durante
e após as relações sexuais impacta a vida de cerca de 50% das endomulheres. Por
conta da dor não tem como existir prazer no sexo. Muitas mulheres perdem a vontade de transar e
se tornam assexuadas mesmo aquelas que têm um companheiro. Os remédios fortes,
principalmente, os à base de morfina, e os anticoncepcionais são agravantes que
contribuem para perda da libido. Por conta dessa falta de vontade de sexo
muitas mulheres são obrigadas por seus companheiros a transarem. Muitas mulheres
são abusadas sexualmente dentro de casa.
Além do
machismo sofremos também com a discriminação por parte dos médicos, independentemente
do sexo deles. A principal acontece pela “não valorização” das nossas dores -
infelizmente muitos acham que são psicológicas -, e também por não darem bola
para alguns sintomas da doença, em especial, o principal dele: a cólica muito
forte. Eu passei por isso, não tive minha queixa valorizada pelo meu
ex-ginecologista. A intensidade da dor também é discriminada por muitos
médicos. Uma mulher com endometriose leve pode sentir mais dores que aquela com
endometriose profunda. A dor independe do grau. Precisamos mudar o pensamento
retrógrado que permeia muitos dos especialistas e abrir suas mentes para aquilo
que estudos científicos comprovaram.
Como querem
que a mulher engravide se ela não consegue ter relação sexual? Sei que é
difícil achar um bom especialista na doença, mas se você endomulher ouvir algo
semelhante vá atrás de um especialista que te escute, que te acolhe, que trata
a mulher como um todo e não apenas a doença. A mulher não é culpada por nada. Precisamos
mudar esta realidade e isso depende de cada uma de nós. Que o corajoso
depoimento da nossa querida endoirmã Alessandra abra seus olhos e lhe dê
coragem para enfrentar de peito aberto a ignorância do machismo e da
discriminação que ainda está impregnada em nossa sociedade. Somente nós, os
jovens, poderemos transformar nosso Brasil num país melhor e mais justo. Vamos
agir em prol de nós mesmas? Pense, reflita! Beijo carinhoso!
Nenhum comentário:
Postar um comentário