quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

"A VIDA DE UM ENDO MARIDO": VOCÊ OUSA ACREDITAR?

O primeiro texto de 2014 de "A Vida de um Endo Marido" chegou em boa hora e com as palavras certas. Aliás, Alexandre sabe como ninguém o que é viver ao lado de uma endo mulher que sente dores. Claro, pois aquelas que não têm dores, não sabe como é viver com a dor da endometriose. Fácil falar, difícil é respeitar, mas e se a gente em vez de ficar ouvindo essa ladainha de quem não entende (e alimentando a ignorância) não começamos a dar a volta por cima e tentarmos a todo esforço (e com muitas lágrimas) a sorrir? É possível tornar ao menos alguns momentos (mesmo na dor) prazerosos. E é isso que eu vejo em raras pessoas, mas existem e são reais, que é possível sorrir, ficar alegre. Isso é ter ousadia de tentar ao menos dominar a doença. Afinal, somos Endo Guerreiras e precisamos todos os dias ousar e acreditar que aquele cada novo dia será melhor. No fim do texto, Alexandre dá uma grande ideia de como podemos agradecer o apoio dos companheiros na Marcha Mundial contra a Endometriose. Você ainda não se inscreveu? Inscreva-se já! Está perto para o fim do nosso silêncio! Beijo carinhoso! Caroline Salazar 

Por Alexandre Vaz

Todo dia a gente encontra alguém que merece um pouco da nossa atenção. Mas, por vezes, estamos tão focados em algo, que podemos passar direto por essas pessoas sem enxergá-las. Às vezes na rua vemos pessoas com deficiência física, por vezes, isso pode nos incomoda e talvez olhemos para outra direção, tentando evitar que aquela realidade se materialize na nossa mente. É mais fácil negar a existência de alguém diferente de nós do que enfrentar a realidade e chegar junto, sorrir e oferecer um sorriso sincero. Talvez ajudar de outras formas, quem sabe.

O sofrimento que vemos nas pessoas, ou que imaginamos ver, por terem uma deficiência física, algum tipo de limitação, não é necessariamente aquele que pensamos. Por vezes, as pessoas pensam que alguém sem o uso de suas pernas será infeliz por estar em uma cadeira de rodas, em vez de poder andar e correr como a maioria de nós (nota da editora: e já mostramos na coluna as incríveis histórias de superação, a do australiano Nick Vujicic e de Rick Hoyt). Sem hipocrisia, pergunte a qualquer uma dessas pessoas se gostariam de ter o uso de suas pernas de novo e todas responderão que sim. Mas experimente perguntar quantas são felizes e talvez a resposta surpreenda.

Quando uma pessoa não acredita em nada, todo o esforço parece sem propósito. Não temos vontade de levantar da cama, tomar a ducha matinal, escovar os dentes, tomar o café da manhã e sair sorrindo para o trabalho, entre outras coisas. A falta de crença faz tudo parecer inútil. Terreno fértil para as depressões e outras doenças do foro psicológico, a mente que não é cultivada com uma vontade, uma certeza, não comanda o corpo para a ação.

Essas crenças não precisam ser religiosas. Posso estar falando de acreditar em si mesmo. Mas encontre algo em que acreditar, pois seguramente essa coisa existe. A maior deficiência que alguém pode ter é a falta de crença. Quando a cabeça não comanda o corpo, ele não se move. Mas você pode ver uma pessoa em cadeira de rodas se movendo de um lado para o outro. Na verdade, algumas delas são muito ativas e produtivas até. Chegam a parecer pequenos furacões que levam tudo na frente, e boa parte delas sorri bastante. Mas sorri como? E porquê? Parece que ficou louco, está sorrindo tendo perdido o uso das pernas? Pois é, mas ter perdido as pernas não significa ter perdido tudo o resto. Você ainda mantém muita coisa funcionando no seu corpo. E essas partes de você que ainda funcionam, podem ser usadas para construir algo, SE... você acreditar que é possível.

Trabalhar com uma portadora de endometriose para ajudá-la a entender que a vida não acabou, que ela pode ainda fazer muita coisa de útil e sentir-se feliz, pode ser um longo caminho. Precisamos acreditar em dobro, porque enquanto ela não acredita, nós temos que emprestar uma parte dessa crença para ela. Melhor investimento que você alguma vez fará na sua vida, investir em resgatar alguém de um buraco escuro como a endometriose pode ser.

E falo que pode ser, porque não tem que ser. Várias vezes a minha esposa escutou dos médicos que ela até tem boa cara. Duas coisas: primeiro, para falar que ela tem boa cara basto eu, o marido. Gostei quando olhei, tá mais ou menos igual nesses anos que passaram... é, pra mim tá bom. Segundo, mas será que alguém que tem a vida tão afetada por uma doença como essa, precisa perder tudo o resto? O direito a sorrir, a ser feliz, a se cuidar... Das coisas mais importantes para uma mulher é a sua imagem, a sua auto-estima.

No último fim de semana tive o privilégio de estar sentado à mesa durante o jantar onde estavam pessoas interessantíssimas. Dava para ver no olho de cada uma que cada um delas têm uma história pra contar. Uma jovem lá, falou uma coisa que eu tinha até esquecido. Não sei quantas pessoas no Brasil já ouviram falar de Simone de Oliveira, cantora e atriz portuguesa, e uma grande senhora. Respeitada por todo o público, uma mulher de armas, ela tem uma presença carismática e que não dá pra não notar quando entra na sala. Vou já dizendo que ela é a pessoa menos fútil que eu posso imaginar, e já vão perceber porquê.

Simone teve diagnosticado um câncer na mama. Precisava ser removido, mas implicava a remoção do peito também. Ela falou em entrevista que em primeiro lugar, não foi na família que ela pensou, nem que iria ficar sem um peito. Foi ter que fazer quimioterapia que a horrorizou. “Meu Deus, eu vou perder todo o meu cabelo e ficar careca.”

Geralmente isso parece fútil não é? A importância de fios de cabelo que podem crescer de novo, comparados com a perda de um peito ou com o risco de vida. Mas isso só revela quão importante a imagem é para a mulher.

Claro que os homens reclamam das duas horas que elas levam para se aprontar. Ocupam o banheiro por horas, a gente atrasado querendo sair pra rua, e quando a porta finalmente abre, sai a diva por entre uma nuvem de laquê... Parece D. Sebastião voltando para seus súditos após séculos perdido no nevoeiro.

E neste fim de semana aconteceu o mesmo isso aconteceu aqui em casa. Eu me descabelo inteiro com essas demoras. Mas ela sabe que depois passa. Quando chega pra mim linda e maravilhosa, sorrindo... tudo passa. Eu sou feliz novamente porque ela está se sentindo bem.

Ser portadora de endometriose não significa que você não possa ser feliz, que não deva se cuidar. Pelo contrário, deve se cuidar sim, mais ainda até. Uma mudança de visual faz milagres como cada leitora poderá confirmar. Não tem dinheiro para ir no cabeleireiro ou na esteticista? Fala com uma amiga, ela te ajuda. Aposto que vai ser gostoso, mulher não vai no cabeleireiro apenas para cortar o cabelo. Uma boa fofoca também faz parte.

O que eu gostaria que vocês interiorizassem é isso: Ser feliz ou infeliz é uma escolha que cada uma faz.

Uns dias atrás uma moça que eu imagino ser inglesa, me perguntou no facebook como era lidar com a endometriose. Ela é portadora. Eu respondi que depende muito da sua atitude. Pode ser uma calamidade enorme que destroi tudo na sua vida, ou apenas uma doença cara, complicada, que causa muita dor, que muitos médicos desconhecem e que não tem muitas respostas.

Se você é portadora, pode chorar, berrar, espernear até, a sua realidade não vai mudar por isso. Pode mudar por outras coisas, como encontrar o médico certo que a apoie e faça o tratamento específico para o seu caso. Você até pode se sentir condenada a ter endometriose, e talvez até esteja. Mas estar condenada a não sorrir, a não ser feliz, a perder o que de bom sua vida tem quando a doença dá trégua... isso é a sua escolha e ninguém pode fazer nada para mudar, apenas você mesma. Essa mudança vem de dentro, da sua atitude perante a adversidade.

Se tiver um companheiro compreensivo, aproveite essa ajuda. Seja compreensiva também, o homem sofre muito do lado da portadora. Por vezes pode acontecer que a gente quase perca o juízo. É uma coisa bem cruel ver a mulher que a gente ama sofrendo tanto e sem poder fazer nada. Isso machuca, amassa o coração, e tem seus efeitos na mente do homem.

Como sabem, a Marcha Mundial irá acontecer no dia 13 de Março. Eu gostaria de ver acontecer uma coisa simples, mas bonita. Que toda a portadora que acha que tem um bom companheiro do seu lado, levante o braço com um lenço amarelo amarrado no pulso, fazendo assim uma homenagem a quem sofre do seu lado. Meninas, vocês precisam parar de xingar os maus exemplos e elogiar os bons. Talvez muitos homens não ajudem mais, ou sejam mais compreensivos por se sentirem isolados. Mas se constatarem que não estão sozinhos, que cuidarem da sua companheira, sofrendo junto e respeitando ela, não belisca a sua masculinidade, quem sabe quantos mais não serão os companheiros que vocês desejam?

Responda pra si mesma: Você ousa acreditar? 

2 comentários:

  1. Olá Alexandre,
    Que texto belíssimo, quanto encorajamento tu tens passado para mim e para minha endoesposa. Sempre animo a minha esposa com relação a essas coisas, a beleza estética, algo que elas levam muito a sério. E mesmo doente e com dor constante, sempre a incentivo para ir ao salão de beleza. Ela gosta de usar maquiagem para me receber quando volto para casa depois do trabalho e sempre falo que ela é linda. Superando a dor mostrando sua beleza. Grande abraço

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  2. Obrigado Paulo, é sempre bom a gente ter algum feedback das pessoas para saber se está agradando. Parabéns pelo apoio que dá pra sua esposa, é isso mesmo. Estimule um pouco a vaidade dela, elogie sempre que achar que ela merece. Mulher garbosa fica mais gostosa né?

    Esse texto saiu, veio do coração como os anteriores, e vão sair outras coisas. Deveremos ter novidades. Vamos aguardar pelo nosso presente para as mulheres, vai ter muito homem agradecido por aí.

    Nossa experiência no blog tem mostrado os caminhos que devemos abrir em conjunto para que o apoio para as portadoras e seus companheiros seja o melhor possível.

    Quando eu puder ir aí no Brasil a gente combina um chope, joga um pouco de conversa fora e dá aquele abraço. Pensando bem, tou combinando chopinho com tanta gente que acho que minha estadia aí será um porre continuado monumental até a hora de entrar no avião de regresso. Dá pra ser um suquinho de caju?

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